Detalhes na conformação do crânio e no DNA acabam de revelar uma nova espécie de mamífero marinho na América do Sul. Trata-se do lobo-marinho peruano, um bicho cujos primos são velhos conhecidos nas praias do extremo sul do Brasil. O animal andou sendo empurrado para as raias da extinção por causa do fenômeno El Niño, mas a descoberta de que ele é uma espécie distinta pode ajudar a priorizar sua proteção.
Segundo a bióloga Larissa Oliveira, o batismo científico do novo lobo-marinho pode acontecer em meados deste ano. “Ainda precisamos acertar alguns detalhes da publicação”, diz Oliveira, que prefere manter o mistério sobre o nome oficial da espécie. A única certeza é que seu “primeiro nome”, o do gênero, será Arctocephalus, assim como o de seus parentes próximos já descritos pela ciência.
Pesquisadora do Grupo de Estudos de Mamíferos Aquáticos do Rio Grande do Sul (Gemars) e pós-doutoranda da Pontifícia Universidade Católica (PUC-RS), Oliveira é a principal “madrinha” desse batismo. Ela visitou a população de lobos-marinhos do Peru em 1996, justamente o ano em que aconteceu um dos piores El Niños já registrados.
Hecatombe
Sorte da bióloga, azar dos lobos-marinhos: “Morreram muitos filhotes”, lamenta ela. O que acontece é que o El Niño gera um aquecimento anormal das águas do oceano Pacífico. Com isso, as águas frias, ricas em peixe, desaparecem da costa peruana, levando os mamíferos à morte por inanição. Os mais vulneráveis são justamente os bebês, que dependem da mãe para alimentá-los. O resultado da bagunça climática foi a queda da população dos bichos de quase 25 mil para pouco mais de 8.000.

Trio de lobos-marinhos peruanos faz charme à beira-mar
Os resultados não podiam ser mais claros: os bichos do Peru parecem ser primos de segundo ou terceiro grau quando comparados ao parentesco muito mais próximo entre os lobos-marinhos dos demais lugares. Os machos da espécie peruana têm cabeça bem maior, e de formato diferente, e a divergência presente no DNA é maior do que a que existe entre duas espécies já descritas do mesmo gênero, o Arctocephalus.
Além desses detalhes mais palpáveis, há outras razões para distinguir uma espécie da outra. Uma delas é o maior tamanho das fêmeas peruanas, cuja diferença em relação aos machos não é tão gritante quanto a dos bichos do Atlântico. Esses últimos, aliás, acasalam-se num sistema de harém capaz de deixar qualquer príncipe árabe feliz: após lutar ferozmente, o vencedor pode arrebanhar até umas 15 fêmeas. Já os lobos-marinhos do Peru são menos adeptos do combate.
“Eles se comportam mais como pavões”, compara a bióloga. Cada macho se exibe pacificamente, até que as fêmeas façam sua escolha de parceiro. A pesquisadora calcula que as espécies tenham se separado há cerca de 500 mil anos – para se ter uma idéia, calcula-se que a idade da nossa espécie não ultrapasse os 200 mil anos.

A bióloga Larissa Oliveira com um bebê da espécie peruana
“Ainda não sabemos o porquê disso”, conta Oliveira. “O curioso, porém, é que essa separação das populações do Peru também aparece em outras populações de mamíferos, como leões-marinhos e golfinhos.” Não é impossível que também existam espécies novas desses dois bichos ali. A bióloga pretende investigar esses outros mistérios -- isso, é claro, se conseguir emprego após o fim do pós-doutorado, dificuldade comum entre os jovens cientistas brasileiros.
Fonte: G1 (Brasil)
Sem comentários:
Enviar um comentário